A maioria das pessoas de nossas igrejas não sabem nada da Bíblia.
As poucas pessoas que leem a Bíblia, não sabem saborear a Palavra. Só
conseguem perceber o que a letra lhes diz, não conseguem ver as
milhares de imagens que elas evocam. Se uma imagem vale por mil
palavras, na Escritura, uma palavra vale por um milhão de imagens. A
imagem está enclausurada, é projeto finalizado. Uma palavra rola, bate e
volta e sempre faz algo diferente em cada um. Ela é livre,
surpreendente. Mas poucos sabem disso.
Os reformadores se empenharam em devolver a Bíblia ao povo na sua
língua, mas parece que apesar do esforço o povo não tem aproveitado o
privilégio que repousa debaixo de suas axilas.
A Bíblia se tornou um livro encantado, feito ídolo. Alguns usam para
poder correr com o carro, pois se a Bíblia estiver ali pode garantir uma
boa viagem. Outros a deixam aberta para espantar os demônios que povoam
a casa, outros colocam debaixo do travesseiro para poderem dormir sem
sobressaltos. Ler que é bom, nada.
Lembro de uma história de Tyndale, que encerrou uma demorada e
acalorada discussão sobre a natureza da ceia simplesmente perguntando
aos seus interlocutores:
- Vocês sabem onde se encontra o texto sobre a Ceia nas Escrituras?
Após retrucarem, e resistirem a pergunta eles finalmente admitiram:
- Não sabemos.
Poucos líderes estão preocupados em curar essa ignorância. A velha
escola dominical não tem mais nenhum paralelo na rotina da igreja.
Parece até que a leitura das Escrituras não faz mais parte da essência
nem mesmo da vida de um pastor. O ativismo que nos faz produzirmos
programações em série, também nos roubou o tempo com a palavra. Nas
próprias programações, o tempo para escutar foi reduzido, e é difícil
conseguirmos ouvir algo consistente, razão pela qual os pregadores
televisivos, falsos profetas, e embusteiros levam o coração e o bolsos
das pessoas.
Como se tudo isso já não fosse suficiente as forças das trevas fazem
um eficiente trabalho nos meios educados afastando as pessoas da Palavra
sob o argumento de que ela é matéria para ignorantes e no meio das
pessoas simples convencendo-as de que só os intelectuais podem entender a
Palavra.
Pregação fraquinha
Tudo sobe ou desce de acordo com a liderança é o lema de John
Maxwell. E também a chave para entendermos o analfabetismo bíblico de
nossas igrejas. Precisamos reforçar nossos púlpitos. Jesus transformou a
água em vinho e nós retribuímos o milagre transformando o vinho novo da
palavra em água, declarou profeticamente Michael Green.
Falta integridade. Quando a necessidade de
sobrevivência tem prioridade número 1 na vida de um homem de Deus, eis
aí um homem inofensivo ao reino das trevas, e um excelente parasita
eclesiástico. Quem vendeu a alma aos donos de igreja acaba não tendo
nada o que dizer.
Falta arte. Quando lemos as Escrituras, vemos os
homens de Deus usando todos os recursos disponíveis para comunicar a
Palavra. Eles usam símbolos visuais, aforismos, histórias, perguntas e
dramatizações para despertarem as pessoas. Tudo isso leva tempo, o que
parece não ter mais, nossa agenda. Ezequiel para tomar apenas um
exemplo, rapa seu próprio cabelo e o divide em três partes, soltando uma
parte dentro de Jerusalém, outra fora dos muros e outra ao vento para
dramatizar a palavra de Deus ao povo. Deveríamos fazer o mesmo quando
ocupamos o precioso tempo no domingo.
Falta tempo. Os líderes substituíram seu tempo com
as Escrituras por busca de comida requentada. Rezam por cartilhas de
visões prontas e roubam seus oráculos de outros profetas, sem verificar
se o profeta é falso ou não. Então acabam errando duplamente sendo
papagaios e falsos. No começo apostólico os líderes foram enfáticos em
esclarecer ao povo que se dedicariam a oração e a Palavra.(2)
Falta profundidade. Conhecimento dos ambientes e contextos, conhecimento de si mesmo e conhecimento dos problemas que afligem as pessoas.
Falta simplicidade. Sempre amei as palavras. Vem de
família. Apreciava cada nova palavra aprendida e gostava de utilizar
logo em meu vocabulário. Sei que parecia metido, e às vezes eu era
mesmo.
Junto com essa paixão veio também um efeito colateral, se posso
chamar assim: uma tendência ao academicismo. Quando comecei a estudar
homilética com o professor Itamir em 1990, usei em uma de minhas
pregações a palavra “sorumbático” que logicamente nenhum de meus
colegas entendeu, o que me rendeu muitas críticas. “Você usa palavras de
difícil entendimento” e “Poderia ser mais simples”, “Tem futuro mas vai
ter que melhorar o vocabulário”. É o que tenho tentado fazer até hoje
lembrando da dura advertência de Martinho Lutero:
“Malditos sejam todos os pregadores que na Igreja visam as coisas
elevadas e complexas e negligenciando a salvação dos pobres e
iletrados, procuram a sua própria honra e louvor e portanto procuram
agradar a uma ou duas grandes personalidades. Quando prego, desço bem ao
fundo.”
Admiro aqueles que produzem conhecimento com o objetivo de gerar
vida. Para servir e não para exibir-se. Mas tenho mais zelo ainda em
fazer a mensagem do evangelho clara e límpida.
Como ler
Deveríamos ler com mais variedade.
Deveríamos ler com mais intensidade. Totalmente presentes. Sem fazer outra coisa junto. Deixando que as palavras nos moldem.
Deveríamos ler sabendo que o resumo do roteiro já foi dado por
Jesus: a Bíblia é a história de amor de Deus pelo ser humano. É Deus se
aproximando de nós em um movimento constante e ininterrupto.
Sempre que prego e escrevo procuro trabalhar de tal forma que minhas
palavras façam cócegas na alma dos que ouvem e leem para buscarem a
fonte de onde vem minhas reflexões e pensamento. Quanto mais liberto dos
meus trapos de tradições mortas e ideologizações vazias, tanto mais é o
impacto na vida das pessoas. As vezes de ira, as vezes de amor, mas
jamais indiferença.
Uma dica pessoal
Nossa proximidade nos levou a superficialidade. Uma pesquisa nos EUA
apresentou um texto de Paulo e a maioria acreditou que pertencia a
Martin Luther King e George W. Bush. Para romper com essa indesejada
ignorância deveríamos procurar sempre uma versão nova que nos ajudasse a
acordar novamente para a realidade impactante das Escrituras.
É o que faz a editora Vida em um brilhante trabalho de tradução da
tradução de Eugene Peterson, a Mensagem. Eu que já recomendei a NVI
amplamente, recomendo agora também essa versão. Com introduções que
primam pela objetividade e simplicidade, um plano visual prazeroso e um
texto que reflete a ideia dos autores em uma linguagem acessível, essa
versão veio para ficar e ajudar nosso povo a se alfabetizar.
Minha filha, uma iniciante na leitura da Bíblia, após a checagem de
um trecho disse: Puxa, que impactante! E eu pensei comigo: É isso! Esse é
o poder da palavra, muitas vezes escondida em nossa verbosidade.
Deixo para vocês quatro extratos e o desejo de uma boa refeição:
De onde vêm todas as guerras e conflitos que assolam o mundo? Vocês
acham que acontecem sem razão? Raciocinem. As guerras acontecem porque
vocês exigem: “é do meu jeito ou nada feito”. E para terem o que querem
lutam com unhas e dentes. Vocês desejam o que não têm e são capazes de
matar para consegui-lo. Invejam o que é dos outros e chegam a apelar
para violência. Tiago 4:1,2
Quem come o pão ou bebe do cálice do Senhor de modo desrespeitoso é
como a multidão que zombou do Senhor e cuspiu nele no momento de sua
morte. I Coríntios 11:27
Vocês estão aqui para ser luz, para trazer as cores de Deus ao mundo.
Deus não é um segredo a ser guardado. Vamos torna-lo público, tão
público quanto uma cidade num plano elevado. Se faço vocês portadores da
luz, não pensem que é para escondê-los debaixo de um balde virado.
Quero posicioná-los onde todos possam vê-los. Agora que estão no alto do
morro, onde todos conseguem enxergá-los, tratem de brilhar! Mantenham
sua casa aberta. Que a generosidade seja a marca da vida de vocês.
Mostrando-se acessíveis aos outros, vocês motivarão as pessoas a se
aproximar de Deus, o generoso Pai do céu. Mateus 5:14-16
Guarda-me dos pecados tolos, de pensar que posso assumir teu trabalho.
Então começarei o dia banhado de sol, com a sujeira do pecado
removida. Essas são as palavras da minha boca, as quais vou degustando
enquanto oro. Salmos 19:13,14
Um abraço quebra costelas
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