Por Isaltino G. C. Filho
Auxilio 01
INTRODUÇÃO
Igrejas em busca de relevância se tornou uma preocupação na mente de
tanta gente que dá vontade de perguntar: como elas sobreviveram até
hoje, num mundo tão competitivo, sendo irrelevantes? Numa sociedade
secularizada e massificada por valores contrários aos das igrejas, como
elas ainda existem, crescem e ainda preocupam tanta gente que se sente
incomodada com elas? Parece que igreja é o negócio mais irrelevante do
mundo e que alguns descobriram agora como torná-la relevantes,
funcionais e interessantes.
Não creio que a questão por trás de tudo seja relevância ou sua
ausência. Há outras mais. Pretendo mostrar isto neste trabalho. E também
mostrar que esta preocupação não tem sentido.
1. DEFININDO TERMOS
A questão se torna mais aguda quando tentamos entender o que se quer
dizer com isso. Porque relevância não é contemporaneidade. É
importância. Neste sentido, se quer se dizer que a mensagem da igreja
não é contemporânea, é verdade. Mas é importante. Porque importância não
é contemporaneidade, mas ter valor ainda hoje. Quem queira dizer que
sua mensagem não tem importância hoje não aborda mais a questão de forma
ou de modelo, mas nega a essência de sua pregação.
Exemplifico para mostrar que relevância e contemporaneidade não são a
mesma coisa. Big Brother Brasil é contemporâneo, mas é irrelevante. A
medicina, como ciência, não é contemporânea, mas é relevante. A questão
me soa mais como um desejo de tornar a igreja contemporânea no mesmo
nível e prática de certos eventos que foram assim definidos pela cultura
prevalecente. Nossa cultura parece ter voltado ao primitivismo. As
pessoas se comunicam mais com o corpo que com a cognição. A cultura do
sacolejo, por exemplo, nos produziu algo curioso: a qualquer momento que
ligarmos a televisão veremos um grupo musical se sacudindo. Pode ser de
baixa qualidade musical, mas se sacoleja, e é exótico, então é
contemporâneo. A letra pode ser paupérrima, mas se está envolta em
sacolejo, é contemporânea. Isto foi definido como o correto.
Tal mentalidade migrou para o eclesiástico. Tudo que é igreja tem um
grupo de louvor. Alguns, e tenho visto nas minhas andanças pelo Brasil,
de baixíssima qualidade musical. Mas é contemporâneo. Um coral ou um
quarteto pode ter excelente qualidade musical, mas é ultrapassado. Como
resultado, digo sem titubeio e sem exagero: a qualidade musical de
nossos cultos caiu muito, nos últimos anos. É medíocre. Ruim mesmo.
Que relevância querem impor à igreja? Relevância não é quantificável.
Nos termos em que está sendo disposta é questão de opinião. Por isso
levanto a questão: o que é relevância e por que a igreja deve ter o que
chamam de relevância?
2. O X DA QUESTÃO: DE QUE ESTÁ SE FALANDO?
Deu para entender que a questão é esta: de que estão falando? O que
querem impingir à igreja? Comecemos pela definição de igreja. Evitarei
definição formal e rebuscada. Ela é agência do Reino de Deus. É o
aspecto visível do Reino invisível. Sua missão é anunciar Jesus Cristo
como Senhor sobre todos os homens. Neste sentido ela é relevante. Ela
anuncia a mais importante mensagem que o mundo precisa ouvir. Se o faz
adequadamente, se alguns de seus setores se desviam desta linha, é outra
questão. O que interessa é isto: como instituição e com a mensagem que
tem, a igreja é relevante ou não? Não é se gostamos dela ou não, mas se o
evento teológico chamado igreja é relevante ou não. E se seu tema é
relevante ou não.
Muita gente tem analisado a igreja por um ângulo secular. Quando
morei em Brasília fui o pastor organizador da Igreja Batista da Quadra
02, em Sobradinho. Foi um dos momentos mais agradáveis no meu
ministério. A Quadra 02 é um dos meus xodós. Fui seu organizador e
primeiro pastor. Foi em 23 de abril de 1988. No dia 25 fui à sede da
TERRACAP para ver se havia algum lote disponível, na Quadra 02, para
igreja. Fomos organizados em uma escola. O representante da TERRACAP me
disse que não havia interesse em vender área para igrejas porque elas
subutilizam a propriedade, com reuniões apenas às quartas e domingos.
Suas áreas não tinham função social. Como terreno em Brasília era raro
(e depois houve tantas invasões de luxo que foram toleradas!) isto não
era interessante. Perguntei-lhe por que havia estádios de futebol em
Brasília, se lá não havia futebol. Qual era a função social dos estádios
de futebol, inclusive o do Sobradinho, onde aconteciam jogos com dez
pagantes. Talvez alguns parentes de alguns jogadores. Qual era a função
social dos botequins? Quem mais ajudava as pessoas, no sentido de
prepará-las para vida, a igreja ou o boteco?
Relevância não se quantifica. Não se mede por quilômetros ou reais
conseguidos. Como a mensagem da igreja é espiritual e apela para o
espírito do homem (que não se quantifica nem se mede) ela é vista como
irrelevante. Mesmo que uma pessoa depravada seja tornada em santa. Mesmo
que um criminoso seja regenerado. Mesmo que um drogado se levante ou
uma prostituta se torne uma mãe extremosa. Tudo isso são valores não
quantificáveis nem mensuráveis. A sociedade valoriza pela quantidade e
pelo movimento. Não nos iludamos com isto.
O mundo não pode avaliar o que foi uma alma consolada num culto. As
pessoas não ficam sabendo que alguém entrou num culto pensando em
suicídio, mas ali foi alcançado pela graça de Deus e saiu com novo ânimo
para a vida. Relevância da igreja, para alguns, só acontece se houver
um curso de artesanato, um prato de sopa dado a alguém, uma muda de
roupa velha dada a outrem, um corte de cabelo feito num mendigo. Porque
estas coisas são quantificadas e mensuradas. Não me entendam mal. Essas
coisas são boas e as igrejas que as realizam estão fazendo algo bom para
a comunidade. São atos bons, mas qualquer organização beneficente pode
fazê-los. No entanto, pregar o evangelho que coloca a vida do homem em
ordem com Deus só a igreja pode fazer. Nenhuma outra instituição pode.
Esta é a relevância da igreja! Esta é sua singularidade! Esta é uma das
razões pelas quais sou apaixonado por igreja. Ela é fantástica!
Quando se discute o tema “igrejas relevantes”, estamos falando mesmo
de relevância ou de uma adequação da igreja a uma ótica mundana esposada
por alguns, que a contemporaniza? Ela pode ser relevante sem ter essa
contemporaneidade. Mas pode ser contemporânea e ser irrelevante. Pode
ter artesanato, sopa e corte de cabelos, mas ser, como igreja,
irrelevante. A relevância da igreja vem de sua mensagem. Se ela proclama
a salvação pela fé em Cristo, ela é relevante. Se ela chama os homens a
se reconciliarem com Deus por meio de Jesus ela é relevante.
3. UM EQUÍVOCO NA AVALIAÇÃO DA IGREJA
Desdobro o argumento: o equívoco está na ONGuização da igreja. Na
atribuição de muitos fatores sociais a ela, fatores que não são errados,
mas são acessórios e não a sua essência. No equívoco de vê-la mais como
organização social, que deve preencher áreas sociais da vida não
atendidas pelo poder público, que como agência proclamadora do Reino. E
digo Reino nos moldes do proposto por Jesus e não como o resultado de
acréscimo de coisas que puseram no termo. Há um blábláblá enorme sobre
Reino no discurso teológico latino americano de esquerda. Falo de Reino
como os evangelhos falam. E parece que quem não tem o acessório, mas só o
fundamental, é visto como irrelevante e pregador de evangelho
descarnado.
Nada também contra as ONGs, por favor. Sei que evangélicos têm uma
imensa capacidade de colocar na boca dos outros palavras que os outros
não disseram (ou escreveram – apenas 24% dos brasileiros conseguem
decodificar um texto). O que digo é isto: a missão precípua de uma
igreja não é prover assistência social nem lazer e entretenimento para
jovens. Ou cuidar de animais de rua (eu mesmo estou me engajando em uma
ONG para cuidar de animais de rua, em Macapá). Estou usando ONG como
figura pelo seu aspecto social, e pela sua estrutura, de comunas, como a
igreja local. Elas têm uma utilidade pública por causa do seu escopo
social.
O terreno é minado e vou andar por ele com cuidado. Mas vou andar. O
noticiário político (deveria ser policial) nos mostra ONGs que foram
criadas para sugar dinheiro do Estado. Trambique puro. Fiel ao seu viés
marxista de ter um Estado forte que domine tudo (o Estado brasileiro
quer até ensinar os pais a não darem palmadas nos filhos), o Ministro
Aldo Rabelo quer menos ONG e mais Estado. O problema não são as ONGS, e
sim que corruptos encontraram brechas na lei e criaram ONGs de fachada
para seus fins escusos. E alguns desses corruptos fazem parte do Estado.
Elas cumprem um papel extraordinário. Suprem lacunas do Estado, são
mobilização popular, têm mobilidade administrativa. Elas são um fenômeno
social fantástico.
Mas a igreja é diferente. Sua utilidade (se podemos usar este termo)
deve ser percebida de outro ângulo. A relevância da igreja reside em ela
cumprir a missão para a qual foi destinada. Eis Atos 2.38: “Pedro
respondeu: – Arrependam-se, e cada um de vocês seja batizado em nome de
Jesus Cristo para que os seus pecados sejam perdoados, e vocês receberão
de Deus o Espírito Santo”. Eis 2Coríntios 5.20: “Portanto, estamos aqui
falando em nome de Cristo, como se o próprio Deus estivesse pedindo por
meio de nós. Em nome de Cristo nós pedimos a vocês que deixem que Deus
os transforme de inimigos em amigos dele”. Esta é a missão da igreja.
4. UMA PROPOSTA DE CRITÉRIO DE AVALIAÇÃO DA RELEVÂNCIA DA IGREJA
Começo de maneira apologética. Quem transformou mais pessoas que
Jesus Cristo? Quem recuperou mais vidas, ao longo da história? Quem
tirou mais gente da lama?
Trabalhando com pessoas com problemas de álcool e drogas, fiquei
conhecendo muito do trabalho dos Alcoólicos Anônimos. É sério e
fantástico e tem ajudado muita gente. Os AA não querem entrar em
competição com ninguém, sei disso. Mas, com respeito a eles, Jesus fez
mais que eles para tirar pessoas do vício.
Pessoas que são regeneradas pelo poder do evangelho são novas
criaturas. Se a igreja quiser ser mesmo relevante, que pregue Jesus
Cristo, poder de Deus para salvação de todo aquele que crê. Estamos
assumindo um complexo de inferioridade em relação ao mundo, e muitos de
nós não cremos mais que pregar Jesus Cristo, o poder de Deus que salva,
regenera e muda para sempre é a mais importante coisa que se pode fazer.
Em muitas igrejas o louvor é mais importante, e em muitos cenários a
igreja é direcionada para o poder político e social. Nossa relevância
vem daqui, e este é o critério correto: só o evangelho pode transformar
pessoas e a sociedade. O resto são folhas de parreira para esconder os
resultados do pecado.
Neste sentido, nada é mais relevante à igreja que cumprir sua missão,
não a descrita pelos missiólogos, mas a estabelecida pelo Senhor Jesus,
e bem descrita na Grande Comissão: “Então Jesus chegou perto deles e
disse: – Deus me deu todo o poder no céu e na terra. Portanto, vão a
todos os povos do mundo e façam com que sejam meus seguidores, batizando
esses seguidores em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e
ensinando-os a obedecer a tudo o que tenho ordenado a vocês. E lembrem
disto: Eu estou com vocês todos os dias, até o fim dos tempos” (Mt
28.18-20)..
Mas recordo uma palavra de A. W. Tozer: “É falsa a concepção de que a
primeira missão da igreja é anunciar o evangelho. Sua primeira missão é
ser espiritualmente digna de fazê-lo”. Igrejas fracas, sem autoridade
espiritual, que pregam um cristianismo folgazão e de entretenimento,
divulgarão um evangelho falso. Há muita gente querendo que a igreja seja
amigável. Há até um livro com este título, Igrejas amigáveis. Recordo
uma frase de Haroldo Reimer: “A igreja não está no mundo para fazer
relações públicas, mas para entregar um ultimato”. Ela chama os homens a
deporem as armas e se renderem a Cristo. Como disse Douglas Webster: “O
pecador não é um coitado, mas um rebelde de armas nas mãos contra
Deus”. Ao invés de seguir George Barna, que ela siga Abraão e seja amiga
de Deus.
Queremos igrejas relevantes? Elas serão relevantes na medida exata
em que compreenderem bem para que existem, qual sua missão, qual sua
mensagem, e estabelecerem suas prioridades. Evangelismo e missões são
suas prioridades. Se elas perderem isto, poderão ser relevantes ao
mundo, mas irrelevantes para Deus.
CONCLUSÃO
Citei Abraão e vou encerrar por ele. Quando chegava numa cidade, o
velho patriarca, antes de tudo, levantava um altar de pedras para Deus.
Depois, para si, fazia tendas. Para Deus a prioridade e o duradouro.
Para si, o secundário e o temporário. Nós construímos mansões para nós e
investimos pouco em vidas. Não investimos mais em missões e
evangelismo, que rendem frutos para a eternidade. Gastamos mais com
patrimônio que com missões. Gastamos mais com futilidades pessoais que
com o Reino.
Abraão foi relevante. Porque foi fiel à sua chamada. Igreja relevante
é aquela que é fiel à sua chamada, que é pregar Jesus como Senhor, e
não a que se contenta em ser trampolim para eleger políticos ou pretexto
para pessoas formarem império econômico. Da mesma maneira, o pastor
relevante não é que se preocupa em escrever seu nome em gás néon, mas em
exaltar o nome de Jesus. É aquele cujo tema predileto não seja ele
mesmo (há gente que só consegue falar de si mesma!), mas Jesus Cristo.
“Eu me propus a não saber nada entre vós, a não ser Jesus Cristo, e este
crucificado” (1Co 2.2).
Eu os desafio a serem obreiros relevantes e a formatarem igrejas
relevantes. Pela ótica neotestamentária e não pela ótica do mundo.
Tenho dito. E era o que eu tinha a dizer.
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